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“Orçamento para Ciência, Tecnologia e Inovação é investimento”, diz Marcos Pontes (T93)

Para o iteano, ministério que comandará a partir de 1º de janeiro deve ter uma atuação transversal, buscando nas novas tecnologias a solução de problemas nas diversas áreas e consequente geração de riqueza e qualidade de vida. Leia entrevista exclusiva à Associação dos Engenheiros do ITA (AEITA)

Desde que aceitou o convite do presidente eleito, Jair Bolsonaro, para assumir o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), o iteano Marcos Pontes (T93) tem ocupado parte do seu tempo na Equipe de Transição do governo com reuniões e conversas com a classe política, visando obter mais recursos para o orçamento da pasta. “Se possível, escreva em letras bem grandes: Orçamento para Ciência, Tecnologia e Inovação é investimento”, pede, durante entrevista por Skype à AEITA no dia 14 de novembro, de Houston, Texas, EUA, logo após uma reunião remota com representantes da comunidade científica brasileira.

O principal argumento de Pontes para justificar o pleito é que o MCTIC deve ter uma atuação transversal, constituindo-se na chave para o desenvolvimento do país em diversas áreas, como saneamento, recursos hídricos, saúde, infraestrutura e meio ambiente. Mas, para atuar, precisa poder contar com uma contribuição orçamentária por parte dos ministérios responsáveis por esses setores. “O investimento em tecnologia tem retorno significativo e rápido”, garante.

Na visão do iteano, para cumprir o que considera a missão do MCTIC – gerar conhecimento, produzir riquezas e melhorar a qualidade de vida dos brasileiros – será necessário atuar nas quatro camadas que compõem o sistema de Ciência, Tecnologia e Inovação (C, T & I): formação de recursos humanos, pesquisa, inovação e comunicação/cooperação. “É como se tivéssemos quatro folhas de papel sobrepostas. Existe uma certa interface entre elas, o que não quer dizer que haja uma hierarquia, ou que uma tenha prioridade sobre a outra. “Significa que há uma ligação lógica entre elas, que precisa ser considerada”.

Além das atividades na Equipe de Transição e das conversas políticas e estratégicas, Pontes tem se dedicado também a divulgar sua biografia e seu currículo, que trazem um leque de qualificações técnicas para o cargo de ministro de C&T, para além do fato de o engenheiro ser o primeiro e único astronauta brasileiro.

Acesse a biografia

Em sua página na Internet constam ainda esclarecimentos sobre assuntos polêmicos, como a sua transferência para a Reserva Militar, em 2006, após a Missão Centenário – que o levou à Estação Espacial Internacional (ISS).

Acesse as explicações para as principais polêmicas

Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação junto com as Comunicações

Ainda não temos a definição exata se o MCTIC continuará com as Comunicações e se assumirá o ensino superior. O que acontece neste momento é que o presidente Bolsonaro, o Onyx (Lorenzoni, futuro ministro da Casa Civil) e outros ainda estão tratando dessa distribuição de “cargas”, vamos chamar assim. Como todo esse sistema está sendo redesenhado, eles ainda não definiram exatamente o que vai ficar em cada ministério, em detalhes, exceto alguns mais diretos, como Relações Exteriores, por exemplo. Na transição, temos trabalhado para fazer o “raio-x” tanto da parte da ciência, tecnologia e inovação, como de comunicações. Mas isso não quer dizer que ficaremos com as comunicações. Significa apenas que temos a tarefa, agora, de fazer esse raio-x também. Se for para outro ministério, passaremos esse resultado para ele. A parte de ensino superior, a mesma coisa. Pelas últimas declarações do presidente, continuará no MEC, por enquanto. Mas também não temos a palavra final, até porque ele deve estar aguardando a definição de quem será o ministro da Educação.

Missão e objetivos do MCTIC

Qualquer empresa grande tem bem clara a sua missão. É importante que todos os funcionários saibam qual é a missão da empresa, independentemente de cargo ou função, para que trabalhem por um mesmo propósito. Eu vejo como missão do MCTIC: gerar conhecimento, produzir riquezas para o país e contribuir para a qualidade de vida dos brasileiros. É simples, como toda missão e objetivos devem ser, para que possam ser lembrados a todo momento. Então, quando falamos em gerar conhecimento, estamos falando não só do conhecimento gerado dentro das universidades, que estão no MEC, mas também das pesquisas que geram conhecimento – a pesquisa básica. As inovações também acabam produzindo spin-offs, que também são geradores de conhecimento. Falando de produção de riquezas, como é que se produz riquezas no âmbito de C, T & I? Isso é a aplicação direta. Empresas de novas tecnologias que são criadas, as startups que vão gerar novos empregos, que vão gerar mais recursos para o país. Ou ainda, a melhoria ou agregação de valor aos produtos e serviços que já existem, com ciência e tecnologia. Em vez de exportar matéria-prima, já exportamos o produto completo, com valor agregado. Isso gera riquezas para o país. Tendo mais dinheiro, você consegue desenvolver programas sociais, além da própria geração de muitos empregos. Com mais dinheiro circulando, você consegue ter uma distribuição de riqueza, e não distribuição de renda, simplesmente. E aí vem a terceira parte, que é contribuir para a qualidade de vida. Automaticamente, quando você produz riquezas, aumenta a qualidade de vida, por meio da geração de empregos. Como dizia Ronald Reagan, o emprego é o melhor programa social que existe. Não podemos nos esquecer que as pessoas são a parte mais importante de tudo. Então, me preocupa muito a questão de como nós podemos utilizar a tecnologia para gerar qualidade de vida. O que eu quero dizer com isso? Você pode melhorar o saneamento, por exemplo. Quanta gente no Brasil, hoje, ainda não tem saneamento básico? Isso gera doenças, prejudica a saúde. Então, como podemos utilizar a tecnologia para melhorar o saneamento? Como podemos usar a tecnologia para melhorar o acesso à saúde em áreas remotas, para melhorar a situação das famílias que vivem em situação de seca, por exemplo? Ou para prevenir desastres naturais? Temos os alertas antecipados para salvar vidas, e assim por diante. A tecnologia pode ser usada para melhorar a qualidade de vida de todos.

Agenda de C, T & I

Você precisa enxergar a Ciência, Tecnologia e Inovação em quatro camadas. Imagine quatro folhas de papel sobrepostas. Existe uma certa interface entre elas, o que não quer dizer que haja uma hierarquia, ou que uma tenha prioridade sobre a outra. Significa que há uma ligação lógica entre elas, que precisa ser considerada. A primeira delas, a que está na base, é a formação de recursos humanos; a segunda é a pesquisa; a terceira, a inovação; e a quarta, a comunicação/cooperação. Temos que atuar em todas elas conjuntamente para termos resultados significativos e rápidos.

A primeira camada – formação de recursos humanos

Essa parte, no meu ponto de vista, nunca foi tratada de maneira mais intensa ou completa por parte do setor de Ciência e Tecnologia. A C&T está muito afastada da Educação. E não pode. As coisas são muito vinculadas. Vamos fazer parcerias com o Ministério da Educação para que possamos, através de programas com o MCTIC, empresas e outras instituições que queiram participar, trazer ciência e tecnologia para o Ensino Fundamental das escolas públicas. Temas que geralmente só vemos em escolas privadas e caras, como robótica, astronomia, eletrônica, radioamador, aerodinâmica, foguetes, que as crianças podem utilizar no que os professores chamam de aprendizagem por projetos. Por que isso é importante? Primeiro, porque ajuda a motivar essas crianças para as carreiras de C&T. Aliado a isso, temos que investir na formação de professores do Ensino Fundamental para a área de Ciências, e nós podemos colaborar com isso, com ferramentas, com aulas, para que essas matérias sejam ministradas de maneira mais eficiente. Com isso, também contribuímos para incentivar o trabalho em equipe, liderança, empreendedorismo, autoconfiança e autoestima dessas crianças. Também é importante investir e incentivar as competições como as Olimpíadas nas diversas áreas do conhecimento. Aí chegamos ao Ensino Médio. Quando terminei o Ensino Médio eu havia feito três cursos técnicos. Por que fiz tantos cursos técnicos? Porque eu pensava no meu futuro. Meu pai era faxineiro, não podia me dar dinheiro todo mês. Então, eu trabalhava, estudava e fazia curso técnico. Era importante, porque me dava uma profissão. Eu podia me virar sozinho, podia ganhar dinheiro sozinho. Se você olhar países mais desenvolvidos na área técnica, como a Alemanha, verá a importância que eles dão para a formação de técnicos. Isso é importantíssimo para o desenvolvimento da indústria e de outras empresas no país. O meu sonho é que o Brasil tenha o Ensino Médio acoplado a um ensino técnico, de modo que todo jovem, quando se formar no Ensino Médio, também seja técnico em alguma coisa, já tenha uma profissão. Isso é possível por meio de parcerias com federações de indústrias, SESI, SENAI, escolas técnicas e pensando com os estados e municípios, de forma que possamos criar, por exemplo, laboratórios compartilhados, que as escolas de nível médio possam utilizar, para não termos que criar um laboratório em cada escola. Também ajuda a reduzir o atrito da ida para a universidade. O número de alunos que saem do Ensino Médio e vão para a universidade é muito baixo. Teríamos que ter um número maior. Então, quando você tem um direcionamento anterior, acaba incentivando. Se você já incorpora a C&T desde o Ensino Fundamental, chega lá na frente com uma base mais forte de matemática, física etc. Lógico que as demais disciplinas também são importantes, português, geografia, história. Estou enfatizando as Exatas porque estamos falando especificamente de C&T. Ainda na formação de recursos humanos, temos a parte de Divulgação Científica. Há muito pouca divulgação de C&T no Brasil. É importante que a população seja informada e perceba a importância da ciência e da tecnologia nas suas vidas. É importante levar os diversos públicos para dentro das escolas, para dentro das universidades, ou termos as universidades trabalhando do lado de fora, na comunidade, trazendo soluções. Precisamos aumentar o nosso número de pesquisadores por milhão. Temos cerca de 700 por milhão. Se olharmos países mais desenvolvidos, esse número vai para 3, 4 mil por milhão. Para isso, tem que haver maior interesse e a população tem que saber mais sobre C&T.

A segunda camada – pesquisa

Nessa parte, que tem a interface nas universidades e institutos de pesquisa, estamos com uma infraestrutura bem degradada. Temos alguns laboratórios de uso compartilhado, mas ainda muito poucos. Não temos, principalmente, o prestígio adequado para a carreira de pesquisador. Com isso, perdemos pesquisadores, as crianças não têm interesse em seguir essa carreira. Precisamos enaltecer, valorizar os nossos pesquisadores. Eles fazem um trabalho importantíssimo que precisa ser mostrado na imprensa. Temos que premiar os nossos pesquisadores pelos resultados que eles obtêm. E é necessário ressaltar o seguinte: pesquisa básica não é inútil. É extremamente importante para o desenvolvimento do país. Às vezes as pessoas pensam em pesquisa básica e acham que é algo feito porque o pesquisador gosta do assunto. Não, ela tem uma finalidade. Muitas vezes, a conjunção de várias pesquisas realizadas ao mesmo tempo, ou mesmo em tempos diferentes, aquela conjunção de ideias, pode gerar uma tecnologia disruptiva que muda a história da humanidade, e que vem da pesquisa básica. Então, pretendemos incentivar muito a pesquisa básica. O CNPq tem problemas de verba, todo mundo tem, mas é importante ressaltar, se possível escreva em letras bem grandes: orçamento para C, T & I não é gasto, é investimento. Os países que hoje são desenvolvidos investiram em ciência e tecnologia e viram que o retorno desse investimento é muito grande e muito rápido. Se um país quiser sair do buraco, tem que investir em C&T. Precisamos conseguir que as autoridades entendam isso. Esse tipo de investimento, em pesquisa básica, tem que vir do sistema público, do CNPq, mais especificamente. Porque na pesquisa básica você não tem o retorno de investimento para as empresas.

A terceira camada – inovação

Aí nós chegamos na terceira camada, que é a parte de inovação. Temos a Finep para ajudar na inovação, mas precisamos de muito mais participação do setor privado. Existem certos entraves para a participação do setor privado, ou de legislação, às vezes a demora, às vezes o ambiente de negócios não é adequado, é o sistema. Precisamos trabalhar o sistema junto com o setor privado e o setor público para melhorar esse ambiente de negócios, para as empresas invistam em C&T e tenham seus produtos com maior valor agregado, melhorem seus serviços e gerem novas empresas, startups etc. Existe uma série de modelos espalhados pelo país, de incubadoras de tecnologia, muito bons. Temos que pegar esses modelos, colocar em cima da mesa, ver quais são os melhores, eleger um modelo base, com algumas coisas boas dos outros acopladas ali e depois, para cada região do país, fazermos a multiplicação desse modelo, de acordo com a vocação de cada região. É importante levar em conta essas particularidades. Para isso é que existem as fundações de apoio à pesquisa em cada Estado, para isso temos entidades dentro de cada federação das indústrias, que tratam de C&T, então vamos usar muito essa cooperação.

Interação das universidades com as empresas

A universidade e a empresa no Brasil ainda são muito distantes uma da outra. Precisamos aproximá-las. Como se faz isso? Existem vários mecanismos. Temos as fundações, por exemplo, que trabalham essa interface. Mas também podemos trabalhar ferramentas que façam essa aproximação direta em paralelo, por exemplo através de laboratórios de prototipagem. Vou inventar um nome, porque não temos ainda, então, copiando o que existe aqui em Houston, por exemplo – eu fui chefe de um desses -, poderíamos chamar de um “Laboratório Compartilhado de Prototipagem e Inovação”. Por que? Porque nesse laboratório, aqui, você tem a Nasa, você tem a Universidade de Rice, a Universidade do Texas, a Boeing, a Lokheed Martin, enfim, uma série de empresas, universidades e centros de pesquisa trabalhando juntos, compartilhando equipamentos. Veja como isso é mais eficiente. Se eu tenho uma empresa, para mim fica caro, com todas as cargas de impostos e tudo o mais, investir em tecnologia. Eu mal estou conseguindo investir em funcionário. Agora, se eu reparto essa carga com outras empresas, como uma cooperativa, o governo ajuda e você tem organizações como o Sebrae para orientar as pequenas empresas que vão sendo criadas ali, se você tem a participação de universidades com cérebros bem remunerados, fica muito mais fácil. Então, esses laboratórios compartilhados podem e vão ser criados segundo as vocações de cada região, com o apoio dessas organizações. E eles podem ser cabeças de rede de tecnologias específicas, usando as instituições do próprio MCTIC e de outros ministérios para apoiar, fazer funcionar e gerar, de novo, recursos, riquezas e qualidade de vida para as pessoas ali naquele entorno.

A quarta camada – comunicação/cooperação

A quarta camada, extremamente importante, é onde a maior parte dos projetos falha – por falta de comunicação e cooperação. Se você observar, fizer um levantamento de projetos que falham, você vai ver que a comunicação está no topo da lista de problemas. São pessoas que não se comunicam, são organizações que ficam sozinhas, que querem fazer um trabalho para o outro sem olhar para o lado, muito ego envolvido, pessoas que levam para o lado pessoal, que dizem “eu não trabalho com ele”, não existe isso. Temos que trabalhar para o país. Então, eu vejo o MCTIC como o foco, o ponto exato e correto para fazermos essa coordenação entre todos os ministérios. O que eu quero dizer com isso? A tecnologia está em todo lugar – na Saúde, na Segurança, na Defesa, na Agricultura. Em tudo o que você olhar, verá tecnologia sendo aplicada. Temos o Conselho Nacional de C&T, que poderia ser muito mais explorado, o CCT, liderado pelo presidente da República e com grande participação do MCTIC. Quero utilizar essa instituição para fazer a coordenação com todos os ministérios.

Escritório de projetos

Vou criar dentro do Ministério um escritório específico para gerenciar projetos, para que possamos operar como um amálgama e fazer a comunicação e a coordenação entre os ministérios. Por exemplo, se você é do Ministério do Meio Ambiente e precisa de tecnologia para fazer o monitoramento do território. A sua função dentro do seu ministério não é desenvolver tecnologia. É entender as necessidades na sua área de atuação. Deixe a tecnologia com a gente. Você passará a ser o meu cliente de projeto. Você passa as especificações e eu desenvolvo com o meu escritório de gerenciamento de projetos. Você entra com recursos – e essa é uma maneira de aumentar os recursos para a C&T – eu também entro com recursos e desenvolvemos isso com soluções brasileiras, usando o nosso sistema, dando satisfação aos nossos pesquisadores. É importante não só ter recursos, mas ter satisfação no que faz. E o público estará vendo a tecnologia acontecendo na ponta. Ele vai ver que esse é um projeto em conjunto com o MCTIC. “Ah, é para isso que serve o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Está junto com o Ministério do Meio Ambiente fazendo isso.”

Atuação transversal do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação

Nosso Ministério é o lugar ideal para se trabalhar transversalmente, com todos os outros ministérios. Imagine a seca no Nordeste. Onde não chega a água da transposição do São Francisco. Tem gente morrendo de fome, tem gado morrendo. Imagine que, em projetos conjuntos com os ministérios, nós entremos com os equipamentos para fazer dessalinização da água. O Ministério da Defesa entra com a perfuração dos poços, mas você sabe que perfura o poço lá e sai água salobra, não dá para beber nem usar na agricultura. Então, o Ministério da Defesa fura, nós fazemos a parte de dessalinização, colocamos energia eólica, solar, o que der para fazer, cria-se um ecossistema econômico e social, fazendo essa água ser bombeada dia e noite para um reservatório grande, que distribua para pequenas plantações, tipo agricultura familiar ali no entorno. E aí, naquele mesmo local, com o Sebrae, criamos uma cooperativa para que esses agricultores familiares possam ganhar mais dinheiro com isso. Você vê como estamos criando um sistema econômico junto com desenvolvimento social, ao mesmo tempo. Essa é a ideia. Trabalharmos em conjunto. As pessoas vão ver que a tecnologia está ajudando. Com isso, atingimos o terceiro objetivo, que é propiciar qualidade de vida para as pessoas. Essas pessoas começam a se organizar melhor para vender seus produtos, a área de Infraestrutura pode fazer estradas para escoar a produção. Tendo mais conhecimento, as pessoas começam a desenvolver outros tipos de negócios na região, e assim por diante. Eu sou embaixador da ONU para Desenvolvimento Industrial Sustentável. Nós temos muito esse tipo de aplicação e eu sei que dá para fazer. Só precisa de cooperação entre os ministérios e o MCTIC é a chave para isso, porque além de estratégico ele pode ter impactos e efeitos em todos os outros ministérios.

Cooperação internacional

A parte de cooperação internacional é importante porque projeta a imagem positiva do país, principalmente quando você tem projetos de desenvolvimento sustentável. O Brasil é um país privilegiado em termos de recursos naturais. Nós podemos, usando a tecnologia, criar projetos que serão modelos para o planeta. Imagine passarmos de vilões, cortando árvores, para modelo de desenvolvimento sustentável. Temos condições de fazer isso aqui. Nesses projetos internacionais eu tenho facilidade, pelo fato de trabalhar há mais de 20 anos no exterior, com a Nasa, com todas as organizações que trabalham com a Nasa, com outras agências do planeta, tipo agência espacial europeia, agência espacial japonesa, canadense, russa. Todas as organizações trabalham juntas na parte de pesquisa e desenvolvimento, a minha rede de contatos internacionais é muito grande. Além de ser astronauta, sou embaixador da ONU para o Desenvolvimento Industrial Sustentável, o que abre um outro leque grande de possibilidades de projetos da ONU, recursos que possam vir do exterior em projetos importantes. Também tenho relacionamentos pessoais, por exemplo, o Pedro Duque, que é astronauta, também é ministro de C&T da Espanha. É meu amigo. A governadora geral do Canadá é minha amiga, já dividimos sala. Todos esses contatos serão feitos de imediato, porque essas cooperações internacionais são valiosas em termos de conhecimento, de intercâmbio de tecnologias, de pesquisadores. Todo esse complexo, esse sistema de quatro camadas, ajuda a mostrar a importância estratégica da C&T. E quando ele funciona, automaticamente as pessoas começam a apoiar mais. Porque elas estão vendo o resultado. Você tem que enxergar o público, as pessoas, como stakeholders dentro dessa “empresa”. Eles são como investidores, acionistas do MCTIC. Então eles têm que ter retorno de investimento. Se eu estou colocando dinheiro aqui eu quero ver o retorno. E o retorno é bem-estar social, são mais empregos, mais riquezas para o país, mais conhecimento. Crianças na escola aprendendo C&T.

Pouco tempo, pouco orçamento

Se você pensar, quatro anos é pouco tempo para fazer esse sistema todo funcionar. Começamos este primeiro ano com um problema sério de orçamento. Eu estou pedindo encarecidamente aos nossos deputados e senadores, principalmente aqueles que estão ali na cabeça para fazer a decisão de orçamento, que revisem o orçamento de C&T e deem o devido valor, a devida prioridade para isso. Não é que os outros ministérios não sejam importantes, lógico que são. Mas, como eu disse, o investimento – não é custo – o investimento em C&T é aquele que dá o retorno imediato ao país. E todos os outros ministérios vão poder se beneficiar desse investimento feito em C&T. Por exemplo, a Saúde tem vários problemas. Mas se o Ministério da Saúde puder investir um pouco em C&T, terá retorno imediato, porque vai melhorar o saneamento. Haverá menos problemas na Saúde. Se o Ministério da Infraestrutura investir um pouco em C&T, terá retorno imediato, porque terá melhores materiais, melhores técnicas para criar estradas, por exemplo, e vai economizar dinheiro. O Meio Ambiente, se puder passar um pouco para a gente, também terá retorno, porque terá mais dados para trabalhar. E assim por diante. Então, precisamos convencer todos esses outros lados a investirem em C&T. Estamos falando de Congresso – deputados e senadores – e estamos falando de todos os outros ministros. A minha batalha agora será conversar com todos eles e falar “Gente, eu sou aquele que irá produzir riquezas para vocês”.

Políticas ambientais e Programa Espacial Brasileiro

São duas áreas que considero muito importantes. Lógico que diante de um cenário como o que vivemos hoje, há uma série de coisas que são importantes. Como é que eu coloco as prioridades? Temos que pensar em como fazer para cumprir aquela missão: conhecimento, riquezas e qualidade de vida. Qual o melhor alinhamento do sistema para que consigamos produzir isso com maior eficiência, quantidade e qualidade. Na parte de meio ambiente, de desenvolvimento sustentável, e eu prefiro chamar assim porque acho mais completo, não podemos perder de vista o desenvolvimento econômico e social. As coisas caminham juntas. Eu me coloco na posição de um ribeirinho da Amazônia, com sete filhos, pescador, sem dinheiro para nada. Chega lá um madeireiro esperto, daqueles completamente errados e diz “Eu te ofereço tanto para você cortar as árvores. Aqui está o equipamento para você fazer corte raso.” Aquela coisa bem suja. O que pensa esse ribeirinho? Pensa que ele tem sete filhos para criar. E entre as árvores e as crianças ele opta pelas crianças. Ele até pode ter uma certa consciência, mas, naquele momento, vai preferir salvar a família dele. Não podemos simplesmente criticar essas pessoas. Por outro lado, eu como empresa, como governo, como algum tipo de organização, posso ir lá e mostrar a esse ribeirinho que se ele colher o açaí, nós podemos, juntos, trabalhar esse produto para que ele possa vender algo com maior valor agregado. E dizer que, quando alguém vier propor a ele que desmate, que denuncie, para investigarmos. Você ganha um parceiro na preservação ambiental, desenvolve um trabalho sustentável e promove o desenvolvimento econômico da região. Sobre o Programa Espacial, e tem também o Programa Nuclear, que é outro lado importante, são programas estratégicos, e isso não quer dizer que estamos pensando em guerras. Porque às vezes, quando falamos que programa nuclear é estratégico já pensam que estamos querendo fazer bomba atômica. Não tem nada a ver com isso. É estratégico para a sobrevivência do país em termos de energia, por exemplo, porque é importante esse tipo de conhecimento. E também, quando falamos da área de espaço, você pensa em um país do tamanho do nosso, precisamos ter satélites para monitorar, inclusive para a preservação ambiental, para melhorar a agricultura em áreas cultiváveis, para que não avancemos em áreas que não deveríamos. Para ver se conseguimos melhorar a produção de alimentos naquelas áreas, o satélite ajuda muito. O próprio Cemaden, se você imaginar um sistema todo que possa ajudar na detecção antecipada de qualquer risco, o satélite é importante. É um sistema que precisa ser ampliado. Temos um sistema funcionando, mas para o tamanho do Brasil ainda precisamos de muitos pontos. Se não me engano, temos cerca de 5 mil sensores, temos que aumentar bastante. Se você imaginar, temos aplicações em comunicações, por exemplo, aplicações de espaço e desenvolvimento de spin-offs, materiais novos que são criados, até novos processos de fabricação, uma série de coisas que vêm do Programa Espacial. Temos uma infraestrutura montada na área espacial e na área nuclear, mas vamos focar na área de espaço, uma infraestrutura já montada que a meu ver ainda está subutilizada por falta de recursos. O que acontece? Vai faltando recursos, você vai entrando em estado vegetativo, em estado de standby. Tudo vai parando, você começa a fazer só as ações de subsistência. O próprio instituto começa a perder um pouco a sua característica, a sua função básica e começa a diversificar. É igual a uma empresa, vou criar outros produtos para ver se eu consigo sobreviver em outros mercados. Precisamos alinhar esses sistemas todos, temos um modelo dual no Programa Espacial – uma parte militar e uma parte civil – e o alinhamento desses dois lados é importante. Os dois lados não são isolados, são complementares, precisam estar juntos. Tudo isso o que eu falei de aplicações são produtos do Programa Espacial que têm que ser trazidos para a população, precisa ser feito um “marketing” deles, devidamente, para que a população veja o interesse daquilo. Para que as pessoas percebam que precisam do Programa Espacial. Percebam a necessidade e comecem a apoiar o programa. E quando a população apoia, a classe política, mesmo aqueles que não entendem do assunto, passa a apoiar também. Porque vê o apoio do público, a divulgação da mídia, e também os resultados.

O Centro de Lançamento de Alcântara

Ainda, no Programa Espacial, além de tudo o que eu já falei, vamos pensar em Alcântara, que é sempre uma polêmica. Eu falei outro dia e essa é a minha intenção, de transformar o Centro de Lançamento de Alcântara em um centro comercial produtivo. Quando você fala isso já vêm os comentários “Ah, você quer alugar Alcântara? Vamos perder soberania?”. Não tem nada a ver com isso. É completamente diferente. Olhe o que temos com a SpaceX aqui. Pergunte se os americanos perderam a soberania ali em cima do Merritt Island ou do Cabo Canaveral, que que fica ao lado da base da Força Aérea. De jeito nenhum! Aquilo ali é americano. Mas se eu, brasileiro, quero fazer o lançamento de um satélite com a SpaceX, eu posso. Eles vão me alugar uma sala, eu abro o contêiner do meu satélite na sala limpa, eles vão me dar toda a segurança para que eu não abra meu satélite e todo mundo veja, eu vou controlar quem entra e quem sai, mas logicamente os americanos terão acesso o tempo todo, o pessoal da segurança de lá, porque eles que são os donos da casa. Monto meu satélite no foguete, lanço, acompanho, pego os dados iniciais, o satélite começa a funcionar, serviço feito. Agora você me dá o cheque. Eu pago e a sala já está alugada para o próximo cliente. É isso o que temos que ter em Alcântara, um sistema que possibilite a produção de recursos para o país, e temos muitas condições de fazer isso lá, parcerias internacionais, parcerias nacionais com empresas de tecnologia, empresas que possam pagar a infraestrutura e gerar recursos para o Programa Espacial, recursos para o Brasil. E ainda, como eu falei no começo, as pessoas são as partes mais importantes. Então, aquele Centro tem que ser adorado pelas pessoas de Alcântara e São Luís. Tipo “Esse Centro é meu”. “Não tire ele daqui porque é parte da minha vida.” Neste momento talvez não seja bem assim. As pessoas não têm tanta interação com o Centro. Como é que aumentamos essa interação? Da mesma forma que aqui. O Johnson Space Center, aqui do lado, era uma fazenda da Rice University, alugada para a Nasa. A Nasa instalou o Centro, não tinha nada em volta. Hoje você vê várias empresas trabalhando ao lado. Essas empresas dão emprego para as pessoas. Essas pessoas têm empresas dentro da Nasa, a Nasa contrata muita gente da redondeza, as empresas terceirizadas que trabalham ali dentro ou são de pessoas daqui ou contratam gente daqui. Tem a formação de recursos humanos, cursos técnicos, as universidades próximas têm que preparar pessoas, profissionais, pensando que existe aquele Centro, que é uma aplicação direta, a vocação daquela região. Desenvolvimento sustentável, desenvolvimento econômico, através dessas empresas da área, que farão com que essa região fique mais rica. São Luís tem que ser uma cidade rica, graças ao Centro. Alcântara tem que ser uma cidade rica, graças ao Centro. Tem que haver uma qualidade de vida altíssima ali, graças ao Centro. Inclusive na preservação daquelas áreas, o Centro pode ajudar. Já temos uma área grande de Segurança, porque não ser também uma área de Preservação Ambiental? O Centro tem que ser uma parte da vida econômica e social da região. E é isso o que pretendemos fazer, levando cursos para lá, promovendo a criação de empresas locais que possam trabalhar dentro do Centro, com o Centro, para o Centro, ter as pessoas participando mais das atividades do Centro, trazer empresas que possam fazer aquilo crescer. Temos que pensar não só no nosso core business, lançar foguetes, mas pensar também em como esse core business pode ser aumentado em sinergia com os negócios locais.

A presença do ITA no espaço e no Ministério

Tanto para a Missão Centenário, quanto para o Ministério, o que levo comigo do aprendizado no ITA é a capacidade de resolver problemas. O ITA – e você e todos os iteanos sabem disso – é um curso que não forma o engenheiro para resolver contas matemáticas somente dentro da engenharia. Se me pedirem para calcular uma estrutura, eu sei calcular. Mas o currículo do ITA não é só para isso. O currículo do ITA é especial, porque nos ajuda a resolver os problemas de qualquer área. Se você olhar a quantidade de engenheiros do ITA que trabalham em áreas que não têm nada a ver com engenharia, é enorme. Mercado de ações, cálculo e gerenciamento de risco, risco financeiro e outros, gerenciamento de grandes empresas. Na própria Equipe de Transição, no pessoal do Paulo Guedes tem dois iteanos. Engenheiros na equipe econômica. Na minha equipe também tem iteanos. A gente traz problemas e eles resolvem problemas. Isso é muito importante. São pessoas que sabem trabalhar com dados, sabem pesquisar e analisar dados. Conseguem sintetizar ideias de uma forma clara e trazer resultado. A gente fica com receio de puxar muito a sardinha, mas como vai sair na AEITA mesmo, não tem problema nenhum. Lógico, temos muitas universidades boas no país etc. Mas o ITA é uma escola muito especial.

Fonte: AEITA.

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